martes, marzo 20, 2007

Então ele disse mais ou menos isso:

Gosto de ti assim mesmo. Desse jeito. E então eu quis dizer que não. Que ele não gosta. Que assim como eu ele queria que fosse diferente. Mas por educação e gentileza, ele insistia em dizer que gostava de mim assim mesmo. Desse jeito.
Mas não disse nada. Me limitei a olhar bem nos olhos dele – verde/mato/esmeralda – e sorrir. Vinho? Me alcança um cigarro? Obrigado. Pega, pega o cálice. Pode largar as cinzas aí mesmo. Nessa fotografia. – moço de cabelos encaracolados sorrindo bermuda chinelo e sem camisa – Quer ligar a TV? Pôr uma música, quem sabe? Caetano, Janis Joplin, Belle and Sebastian, Cartola.
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Qual camisa? Branca, Verde, Preta – atrai energias demais – Azul? Azul e branco, dia de Iemanjá. Calça Jeans desbotada. Tênis branco. Perfume. Dentes escovados. Essência de Lavanda pela casa. Vela azul na cabeceira do quarto. Plantas regadas.
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Ele me disse pra que esperasse. Ia tomar um banho, daqui a pouco as pessoas estariam batendo na campainha. Que já que eu tinha vindo mais cedo que tirasse logo esses tênis e ficasse a vontade. – a casa é sua – E eu disse que ia lhe dar uma Esmeralda de presente. Pra afastar os maus espíritos. Ele riu e tirou a camisa. Desabotoou o botão da bermuda. Pegou uma toalha e botou no ombro suado. Afastou os cabelos ruivos encaracolados dos olhos – seria ele na foto? Quis ir junto com ele pro banho. Mas acendi outro cigarro.
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Uma cerveja. Um computador. Recados. Pessoas. Sorrisos. Cheiros. Sem cheiros. Por isso não tem tanta graça. Saudade. Cinza caindo no chão, cheiro de cigarro no quarto, coração apertado. Cadê a empolgação? Vamos te anima! Cara importante. Casa bonita. Mais uma cerveja. As chaves de casa. Mais uma vela.
Que não me falte a coragem.

O imaginava no banho. O corpo molhado. Os cabelos cheios de espuma. A água quente enchendo o banheiro de fumaça, meu cigarro enchendo a sala de fumaça. Me levanto e vou até a mesinha de centro largar as cinzas na foto e pegar mais um pouco de vinho. Girando o corpo pela sala me sinto tonto. E tomo um gole de vinho. Girando na ponta dos pés pela sala dele me sinto tranqüilo. Calor. Abro os vidros da janela, tiro a camisa. Caio no tapete de costas. Deitado de costas no tapete e sem camisa sinto mais calor ainda. Desejo. Medo. E então, de repente, a vergonha.

Alterius;festum solum invitatus adibis

Ele sai do banho e a campainha toca. Pede pra que eu atenda. Eu atendo. Oi, entra, Ah sim, ele tá no banho, senta no sofá, querida. Oi? Ah sim, pode pegar ali no maço, tá em cima da mesa, eu acho, pega um pouquinho de vinho. – loira vinte anos no máximo calça coladíssima. – Mais campainha. A loira sorri. Eu levanto e atendo a porta novamente. Ele tá se arrumando, saiu do banho agora, claro, pode beber do meu cálice sim. A música? É Cartola. Deprê? Mas é tão lindo. A loira sorri. Sentam-se um do lado do outro. Eu sento no chão e com as cinzas do meu cigarro escrevo o nome dele. Na verdade apenas tento escrever o nome dele, porque obviamente, nunca conseguiria. Mas eu me distraio enquanto espero ele se arrumar. E ele demora. Quando sai, sai secando os cabelos ruivos, barba feita, cheiro de colônia. Pinho. Só de bermuda e chinelos. Eu me levanto, acho que por impulso. Começo a dançar sozinho, ele me puxa. O vinho talvez esteja fazendo efeito. O rapaz senta onde eu estava. A sala se enche de fumaça. O rapaz tira a bermuda. A loira tira a blusa. Ele me derruba no carpete e me beija - vinho maconha pasta-de-dente - A loira sorri. A loira só sorri. O rapaz chega perto põe a mão embaixo da minha camiseta desabotoa a minha bermuda. Desabotoa a dele. Desabotoa a calça da loira. Lindíssima cena. Seria muito pornográfico se não tivesse Cartola ao fundo. Então é tudo tão romântico. Me sinto mais um no harém dele. Quando falou em convidados não imaginei que fosse assim...não que seja ruim, só que. Eu esperava outro tipo de. Pessoa. Festa. Coisa. Toque. Cheiro. Esperava.
E então de repente eu levanto. Desligo o som. Puxo ele e levo pro banheiro. E choro. E entre o choro eu digo que só queria que ele soubesse que não era sempre assim, que tinha gostado mesmo dele, e que não estava me sentindo muito bem, eu iria embora nesse momento e deixava os três a sós, e que pediria desculpas formais com um buquê de flores outro dia, ou que, o mais provável, nunca mais o procurasse.

Um banho de mar. Um banho de cachoeira.

Então ele disse mais ou menos isso: Gosto de ti assim mesmo. E me abraçou. E eu sorri. E deitei a cabeça no ombro dele. E me beijou com suavidade. E ligou o chuveiro. Abraçados dentro da água éramos um só. Éramos um corpo onde caía água quente e espuma.
Levanto a cabeça e o olho nos olhos. Conscientemente, me perco nas matas de Oxóssi.

miércoles, marzo 14, 2007

Vinte e Quatro

Uma poltrona bege. Uma almofada verde musgo. Um cigarro na ponta dos dedos e um copo de Uísque quase sem gelo. Um gato cinza.
E era assim que ela passava a maioria das noites. Sentada na poltrona fumando e observando o mundo pela janela do seu apartamento. Samambaias e Orquídeas espalhadas. Uma televisão que não funcionava mais. Um aparelho de som e alguns poucos discos.
E se levantava, ela levantava apenas para ir até a cozinha pegar mais alguma coisa e voltar. Ou para ir até o banheiro lavar o rosto ou molhar os pés na banheira azul. Se olhar no espelho ou lavar os óculos. Compulsivamente.
E pensava na vida, pensando no que poderia fazer, o que fez e o que está fazendo. Não sentia saudade do passado, não tinha pressa do futuro e sentia um tédio mortal do presente. Mortal e Enjoativo. Como café requentado em um dia cinza claro.

lunes, marzo 05, 2007

Jasmim

São seis da manhã e eu não consigo descansar. Preciso tomar um banho. Estou suado e não consigo descansar. Minha mente gira. Gira por lembranças e projeções. Então eu deito e não consigo. Então eu desisto de deitar. Daqui a pouco vou tentar de novo. Mas antes eu preciso de um banho para limpar o suor. Um banho quente. Por mais que faça muito calor na rua, eu preciso de um banho quente. Preciso deixar a água quente bater no meu corpo por minutos que parecem horas. Preciso deixar a água me relaxar. Eu sinto saudade. Sinto falta da tua presença. Por mais que nunca tenha tido tua presença, sinto falta. Sinto falta de conversar contigo. Porque eu gosto de conversar contigo. Não importo o assunto. Não é o que a gente conversa que me atrai, e sim como a gente conversa. Gosto de como a gente conversa. E sinto falta disso. São seis horas da manhã e eu não consigo dormir porque estou sentindo falta de como a gente conversa. E porque estou com calor. Por mais que a janela esteja aberta e a temperatura na rua esteja muito agradável. Aqui dentro tá calor. Aqui dentro É calor. Dentro do quarto. E de mim. Na verdade aqui dentro é desagradável. É frio quando se falta coberta. E quente quando faltam ventiladores. É desagradável. É um pontinho preto, que sobe, da boca do estômago até o peito. E ali ele dói, é quente e é frio.
Agora eu queria ir pro meio do mato. Ir pra serra. Agora eu queria o cheiro de uma pousada. E um chá inglês de morango – que eu nunca encontro pra vender – antes de dormir. E uma torta de mousse de limão com café bem quente e forte quando acordo. Antes de sair pra caminhar pelos morros. E pelas cachoeiras. Sozinho e descalço. E eu queria que tu tivesse comigo. Pra provar o chá e a torta e o café e o morro e a cachoeira e sentir o mesmo chão e o mesmo sentimento e depois a mesma saudade que eu sinto. Eu queria ir pra Três Coroas passar um tempo no Templo. E não importa o tempo do tempo. Quero ver o pôr do sol em Três Coroas. Sentado na estátua de Shiva. E queria que tu tivesse aqui pra me agradecer por te levar a um lugar bonito e te fazer feliz. Sim, o tempo todo tudo o que eu quero é te fazer feliz e ainda ser agradecido por isso. O tempo todo. Sempre foi egoísmo.
São seis da manhã e eu não consigo descansar. Estou com saudade. E preciso tomar um banho quente e botar um perfume doce que me lembra Jasmim. Estou com saudade. Preciso tanto cheirar a Jasmim quanto precisava escrever.
Estou com saudade.